Memórias do encontro das águas

Uma das coisas mais impressionantes da visita a Manaus é o encontro das águas dos rios Negro e Solimões. São vários kilometros em que você percebe claramente os limites de cada um dos rios pois as suas águas não se misturam. Velocidades diferentes, densidades diferentes, temperaturas diferentes fazem com que a separação dos rios seja um espetáculo visual, algo como vinagre e azeite em escala monumental.
Para mim no entanto, a parte mais bonita do encontro das águas foi ver como meus filhos quiseram registrar esta lembrança para compartilhar, contar e mostrar para as pessoas na volta. Cada um com um potinho de shampoo vazio nas mãos, trazido do hotel, se esticando do barco e coletando a água do local onde os rios se encontravam. Queriam reproduzir no potinho o que estavam vivenciando e levar esta sensação para quem não estava com eles. Mais do que qualquer piranha empalhada ou chocalho indígena este é o verdadeiro presente de viagem que alguém pode receber: com emoção, com pureza e com poesia.

O lado pouco cor de rosa do encontro com os botos.

Confesso que tenho bastante preguiça dos eco-chatos que não usam fraldas descartáveis em seus filhos, não lavam louça com detergente e que dão a descarga uma vez ao dia para economizar a água do planeta. Para mim, o importante é se encontrar o meio do caminho entre conforto e proteção ambiental. O homem tem que ser capaz de produzir fraldas melhores que se desintegrem mais rápido, detergentes bio degradáveis e descargas inteligentes. Consciência ecológica sim, chatice e radicalismo não. O progresso deve existir para nos ajudar a conciliar os interesses…

Os botos sendo alimentados no "quintal"da casa . Um jeito sem graça de ver a natureza.


Existem algumas coisas no entanto, que me pareciam aceitáveis alguns anos atrás e que hoje me incomodam. Nesta viagem foi assim com nossa excursão para ver os botos cor de rosa, os primos dos golfinhos, que vivem nos rios da Amazônia. Os botos que vimos, seguem vivendo dentro do rio Negro mas foram condicionados por uma ribeirinha a receberem comida no mesmo lugar e na mesma hora, em uma espécie de quintal aquático na frente de sua casa, na beira do rio. É uma situação distorcida da natureza, artificial, que gera um incômodo. De um lado um animal bonito, em seu habitat, de outro alguém fazendo dinheiro as suas custas. Vi e conheci o boto mas fiquei mais chateado do que feliz. Foi um jeito cinza de encontrar o boto cor de rosa.
Animais selvagens, condicionados para entreter humanos deixaram de ter qualquer graça para mim. É bom que já existam circos sem animais e pressão sobre touradas e rodeios. Acho que quando nossos netos crescerem eles não entenderão como em um passado tão recente as pessoas se divertiam as custas dos animais.

Os Forest Gumps da Rain Forest

Durante os nossos dias de Amazônia, caminhamos a pé pela floresta, andamos de barco de dia e de noite e vimos araras, tucanos, piranhas, botos cor de rosa, bichos preguiça, cobras e jacarés . A flora é muito mais exuberante do que a fauna e os olhos veem um infinito verde com árvores de todos os tipos e tamanhos. Esta para mim é a grande beleza da Amazônia…o seu verde combinado com os seus incríveis e gigantescos rios. A sensação que eu tenho é que na cabeça dos guias aparentemente árvores e rios não dão muito Ibope e eles pensam que os turistas esperam encontrar um grande zoo tropical a céu aberto. Como você não vê e não encontra grandes animais, os guias mesmo criam histórias. Te falam de aves que arrancam as preguiças da copa das árvores, piranhas que comem as mãos dos ribeirinhos, tucunarés que viram barcos de pescadores , ataques de índios aos caboclos mas a especialidade mesmo são as cobras. Sucuris de 12 metros, cobras que te perseguem e dão botes de 6 metros e até cobras que se penduram nos galhos e dão chicotadas em quem está embaixo. Amazônia tem suas lendas e seus mistérios mas os guias foram os Forest Gumps, os contadores de histórias, da Rain Forest…

A Amazônia é o jardim do quintal ?

Dinheiro secando na mesa do lobby. Indício de que você não está no Brasil...

Você chega no lobby do hotel e encontra uns R$ 350,00 , em notas molhadas, que um hóspede resolveu deixar sobre a mesa para secar. Depois na entrada do restaurante vê uma lousa explicando que jaguar=onça,forest=floresta e fish=peixe. O guia que te leva para pescar piranhas é um indiano que arranha o português. No meio de 30 hóspedes, uns 5 ou 6 falam português…
Em vários momentos você tem certeza que não está no Brasil. E na verdade a Amazônia é mesmo um pedaço do Brasil que o Brasil ainda não descobriu. É do mundo mas parece que não é do Brasil…Você tem a clara sensação de se sentir um estrangeiro em seu próprio país. Eles te perguntam porque os brasileiros não se interessam em vir para a Amazônia e você se esforça para encontrar uma boa resposta (que acaba não tendo.O mais perto que passei foi dizer que o motivo é que ainda não tinham inventado uma Best Buy flutuante no Rio Negro). De jardim do quintal do Brasil como dizia Raulzito, a Amazônia tem muito pouco…O jardim tem muitos outros jardineiros e bem poucos falam português. Fiz turismo sem sair do Brasil, mas certamente fiquei com a sensação de que me conectei um pouco mais com o mundo.

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